Ao Juízo de Direito da ___ Vara Cível do Foro Regional de _____________ – Comarca de São Paulo – Capital.

[Nome e qualificação do autor], por seu advogado infra-assinado, vem, respeitosamente à presença de Vossa Excelência, com fulcro nos artigos de lei, doutrina e jurisprudência invocados no texto abaixo apresentado, para propor em desfavor de [Nome e qualificação completa dos réus], o que faz na forma a seguir e com os elementos de fato e argumentos de direito abaixo expendidos:

1. Dos fatos

Em 00/00/2.017, o autor, ao navegar no sítio eletrônico do requerido na internet, no endereço eletrônico www.xxxxxxxx.com.br, que explora o ramo de leilões de coisas móveis e imóveis, conforme descrição que consta de seu próprio site, se interessou por uma oferta de leilão e acabou por arrematar um veículo, da Marca xxxxxxxx, Modelo yyyyyyy, Ano de fabricação 0.000, cor preta, placas XXX 0000.

O autor, antes da arrematação chegou a consultar o vendedor para saber se existiam débitos sobre o bem, contudo lhe foi informado que havia apenas um débito no importe de R$ 000,00 (valor por extenso).

Na finalização do negócio, o autor pagou os seguintes valores:

– R$ 00.000,00 (valor por extenso) pelo veículo;

– R$ 0.000,00 (valor por extenso) pela taxa de Comissão;

– R$ 0.000,00 (valor por extenso) pela taxa de administração;

– TOTAL DE R$ 00.000,00 (Valor por extenso)

Dessa forma, após efetuado o pagamento do valor total do negócio em 00/00/2.018, por meio de boleto bancário (Doc.j.), conforme as regras do tipo de negócio, teria a empresa vendedora, o prazo de 20 (vinte) dias para a disponibilização do bem ao autor, que seria o responsável pelo custeio do transporte, conforme entendimentos anteriores.

Ocorre Excelência, que o autor é residente em São Paulo – SP e o veículo estava localizado na cidade de xxxxxx – RS, razão pela qual foi contratada por ele, autor, uma transportadora para que o veículo fosse trazido a São Paulo-Capital, contudo ao chegar no local, os funcionários da transportadora acusaram que parte do motor do veículo estava desmontada e as rodas não eram as originais de liga leve.

O autor, imediatamente informado, entrou em contato por telefone e por e-mail com prepostos do vendedor, bem como da primeira requerida XXXXX, contudo, apesar do atendimento, nenhuma solução foi apresentada no momento, razão pela qual ele pediu para que a transportadora trouxesse o veículo da forma que se encontrava, para fins de garantia e para que pudesse avaliar melhor a situação.

Ao chegar no pátio da transportadora em São Paulo – SP, o autor levou o veículo diretamente para uma vistoria de um mecânico, que constatou, conforme os documentos anexados, que o veículo teria que ter trocadas várias peças e que o fato de parte do motor estar desmontada se deu porque havia um problema em um dos eixos, com reparo orçado em torno de R$ 0.000,00 (valor por extenso).

Os orçamentos feitos pelo autor, as peças já trocadas ou que ainda devem ser trocadas, somam a quantia de R$ 00.000,00 (valor por extenso), por problemas mecânicos do veículo adquirido por via do leilão.

Não bastasse isso, mesmo com o preço do negócio pago totalmente, não foi entregue ao autor, nenhum documento do veículo, especialmente o DUT (Documento único de transferência), devidamente assinado e com firma reconhecida pelo vendedor, o que está impossibilitando a transferência da propriedade e o licenciamento do veículo e, portanto, impedindo o próprio uso do veículo.

A situação está causando grave constrangimento ao autor, que sofre diariamente com a falta de providências dos requeridos, que se mantém inertes frente às cobranças de uma solução que já foram feitas, o que constitui, tecnicamente, o interesse processual para a presente ação.

Por essas razões, devem ser as empresas que figuram no polo passivo da ação, em nível de solidariedade, indenizar o autor pelos prejuízos materiais e morais sofridos, bem como serem obrigados a efetuar a entrega do Documento único de transferência, a fim de permitir a regularização e o uso do veículo adquirido.

2. Do direito

2.1. Da responsabilidade solidária das requeridas

Neste caso é incabível afastar a aplicação do Código de defesa do consumidor, pois estamos diante de um fornecedor de serviços e o autor o destinatário final.

Não obstante o proprietário do bem esteja se desfazendo de um ativo, conforme consta da Nota Fiscal emitida, a forma de comercialização se dá por uma empresa que explora essa forma de comercialização (leilões) como negócio, como um fornecedor de serviços que coloca veículos à venda por lances.

Não se diferencia juridicamente daquela revenda tradicional, com loja física, no tocante às responsabilidades pelos produtos que disponibiliza para comercialização, tendo essa comercialização como um negócio explorado e estruturado para gerar lucros, o que o configura como fornecedor.

A jurisprudência já enfrentou situação semelhante e, sabiamente impôs a solidariedade entre o proprietário do bem e quem o comercializa, vejamos:

“APELAÇÕES CÍVEIS – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS C/C RESTITUIÇÃO DE VALOR – PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA – EMPRESA ORGANIZADORA DO LEILÃO VIRTUAL/PROPRIETÁRIO DOS PRODUTOS COLOCADOS NO MERCADO – REJEITADAS – FORNECEDORAS – RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA – ART. 18CDC – FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO – PRODUTOS ENTREGUES COM DEFEITO E EM ATRASO – DANOS MORAIS E MATERIAIS – CONFIGURADOS – RESTITUIÇÃO DE VALOR, NA FORMA SIMPLES – EQUIPAMENTOS NÃO ENTREGUES – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – MANTIDOS – RECURSOS DESPROVIDOS – SENTENÇA MANTIDA. A legitimidade decorre da pertinência subjetiva da ação, que é caracterizada pelo enquadramento entre as partes integrantes do processo e os participantes da relação jurídica material afirmada em juízo. Configura-se parte legítima para figurar no polo passivo da demanda indenizatória tanto a organizadora do Leilão Virtual como a proprietária dos bens que os colocou à venda, especialmente diante da responsabilidade solidária que marca as relações entre os fornecedores (art. 18 do CDC). Nos termos do art. 14 do CDC, o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços. A empresa responsável pela venda em site de sua propriedade, quando omissa quanto às informações relativas à qualidade dos produtos vendidos, deve responder pelos danos decorrentes de sua negligência, por inobservância à obrigação que lhe é imposta pela lei (art. 23 do Decreto nº 21.981/32). Evidenciada a falha do serviço prestado pelas empresas que intermediaram a compra realizada pela internet, não havendo a entrega do produto comprado ou a entrega de produtos defeituosos, resta caracterizado o dever de indenizar. Para a fixação do quantum da indenização pelo dano moral causado, o julgador deve aproximar-se criteriosamente do necessário a compensar a vítima pelo abalo sofrido e do valor adequado ao desestímulo da conduta ilícita, atendo sempre ao princípio da razoabilidade e proporcionalidade. O dano material é aquele que afeta somente o patrimônio do ofendido, que representa o conjunto das relações jurídicas de uma pessoa. Configura-se, portanto o dano quando a parte adquire produto com defeito, embora lhe seja conferida garantia de funcionamento, e também quando deixa de receber produto, a despeito de ter efetuado o pagamento do preço. Consoante dispõe o art. 20 do CPC, o juiz condenará o vencido a pagar as despesas que antecipou e os honorários advocatícios, os quais devem ser mantidos quando fixados de acordo com as alíneas do § 3º. Na ação de indenização por dano moral, a condenação em montante inferior ao postulado na inicial não implica sucumbência recíproca (Súmula nº 326 do STJ). (TJ-MS – APL: 00047664820128120008 MS 0004766-48.2012.8.12.0008, Relator: Des. Eduardo Machado Rocha, Data de Julgamento: 12/08/2014, 3ª Câmara Cível, Data de Publicação: 15/08/2014)”

E mais:

“CÍVEL. RECURSOS INOMINADOS. ARREMATAÇÃO DE CAMINHÃO EM LEILÃO. ATRASO NA ENTREGA DOS DOCUMENTOS PARA TRANSFERÊNCIA ADMINISTRATIVA DO BEM. OMISSÃO QUANTO À EXISTENCIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. APLICAÇÃO DO CDC QUANTO À EMPRESA QUE REALIZOU O LEILÃO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA DEFERIDO. ILEGITIMIDADE DA EMPRESA DE LEILÃO AFASTADA. ATO ILÍCITO DAS RECLAMADAS. PREJUJÍZO SUPORTADO. DANO MATERIAL E DANO MORAL EXISTENTES. CONDENAÇÃO SOLIDÁRIA DAS RÉS. INDENIZAÇÃO MANTIDA. RECURSOS INOMINADOS DESPROVIDOS. (TJ-PR – RI: 000297905201481601040 PR 0002979-05.2014.8.16.0104/0 (Acórdão), Relator: Renata Ribeiro Bau, Data de Julgamento: 11/09/2015, 1ª Turma Recursal, Data de Publicação: 16/09/2015)”

Os princípios deontológicos que norteiam o Código de defesa do consumidor, assim entendidos aqueles que orientam, norteiam e indicam uma direção interpretativa para as normas de direito do consumidor, impõem nessa situação, que, se o dono do produto, mesmo sem ser comerciante, o coloca para venda por meio de um fornecedor de produtos e serviços, se obriga conjuntamente no oferecimento do bem, devido à forma que o fazem, exatamente na forma do artigo  do Código de defesa do consumidor [1].

A situação dos autos então, atrai irresistivelmente a responsabilidade solidária aos réus, que devem responder aos pedidos feitos ao final, de forma conjunta.

2.1. Da obrigação sobre os reparos do veículo e a necessidade da conversão em perdas e danos

As fotos ora juntadas, especialmente as que demonstram a oferta, indicam que o veículo estava em condições de ser utilizado e que não havia partes desmontadas de seu motor, aliás, se tratava de outro veículo.

Estando o veículo adquirido pelo autor, com o motor parcialmente desmontado e impossibilitado de ser utilizado e o bem entregue sem condições de uso, sem o documento (DUT) para que pudesse ter seu registro e propriedade transferidos, estamos diante de uma situação que não era a que foi colocada quando o veículo foi ofertado para venda através de leilão.

Se o veículo foi ofertado e a publicidade feita em torno dele demonstra um motor montado, sem problemas aparentes, não poderia ter entregue um veículo com partes desmontadas do motor.

Tal situação é um descumprimento da oferta, pois foi oferecido o veículo em certas condições que não eram as mesmas quando de sua retirada do local onde estava.

Assim sendo, temos frontal transgressão ao artigo 30 do Código de defesa do consumidor, cujo texto segue abaixo:

“Art. 30. Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado.” (grifo ausente no original)

Não bastasse essa afronta à lei, na descrição do “Lote” (Tentativa de descaracterização do produto, uma vez que foi um veículo que foi comercializado), enviada por ­e-mail para o próprio autor por preposto do primeiro requerido, não constou que o veículo não funcionava ou estaria desmontado e no que tange à especificação que poderiam faltar “peças ou componentes”, jamais o autor imaginou que não encontraria um bem que não poderia ser utilizado.

Veja Exa., a descrição do bem vendido pelos requeridos ao autor, segundo o próprio funcionário do primeiro requerido informou (Doc.j.):

[Mensagem enviada pelo segundo requerido ao autor com a descrição do veículo]

O autor imaginou, pelas fotos que viu na oferta do produto, um bem que era passível de uso e também imaginou que receberia a documentação para que pudesse usufruir do investimento feito.

Desta forma, as empresas ora requeridas deverão arcar com o valor suficiente para que o veículo esteja em condições de funcionamento e uso e cobrar a entrega do documento que possibilite a transferência do registro sobre o veículo perante a autoridade de trânsito.

Não é necessário divagar mais, para poder entender que a oferta, tal qual foi veiculada, não foi cumprida, sendo o autor foi ludibriado, haja vista que as fotos da oferta mostravam um motor montado, aparentemente em perfeitas condições de funcionamento.

Depreende-se da situação, indo além, que existe uma má-fé velada, no fato da comercialização de um veículo com sérios problemas, escondendo-se isso do consumidor, o que além de temerário, deve gerar um revés judicial para que tais situações não se tornem comuns e aceitáveis, gerando insegurança no comércio e atentando contra a economia popular.

Se as empresas requeridas são fornecedoras de um produto colocado no mercado para comercialização, devem garantir que esse bem se presta para o uso e não seja inadequado ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, a teor do que preconiza o caput do Artigo 18 do Código de defesa do consumidor, abaixo transcrito:

“Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.”

No caso, o autor pretende que a oferta se cumpra integralmente, razão pela qual efetuou/efetuará os reparos necessários para o funcionamento do veículo e isso se configura como um dano material, ante ao raciocínio que deveria ter colocado à venda um veículo funcionando, principalmente porque não informado esse fato (do não funcionamento pelo desmonte do parcial do motor).

Diante então, da premissa que a oferta aparentava um veículo em condições de funcionamento mecânico e de plena possibilidade de uso, devem os requeridos providenciar que o veículo, por escolha do autor, seja reparado, conforme autorizativo do artigo 35, inciso I, do Código de defesa do consumidor. Vejamos seu texto:

“Art. 35. Se o fornecedor de produtos ou serviços recusar cumprimento à oferta, apresentação ou publicidade, o consumidor poderá, alternativamente e à sua livre escolha:

I – exigir o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta, apresentação ou publicidade;

II – aceitar outro produto ou prestação de serviço equivalente;

III – rescindir o contrato, com direito à restituição de quantia eventualmente antecipada, monetariamente atualizada, e a perdas e danos.”

Apontados os dispositivos legais aplicáveis aos fatos narrados, temos que a obrigação dos requeridos seria reparar o veículo, de forma a proporcionar o seu funcionamento.

Conforme se verifica dos fatos narrados, o veículo foi retirado da posse do segundo requerido, na cidade de xxxxxxxx – RS e o veículo, hoje, se encontra na cidade de São Paulo – SP, razão pela qual se torna antieconômico o pedido que o veículo seja entregue à posse dessa requerida para os devidos reparos, razão que torna o cumprimento dessa obrigação ex lege por parte de quem vendeu o veículo e deve zelar por seu funcionamento segundo a lei, muito custoso para ser implementado.

Diante de uma situação destas, se faz necessário a conversão da obrigação em reparar o que foi vendido, seja convertido em perdas e danos, no importe gasto/necessário para que o veículo ficasse em condições de uso, nos termos do Artigo 499 do Código de processo civil, transcrito abaixo:

“Art. 499. A obrigação somente será convertida em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.”

Destarte, temos que diante desse desdobramento legal, ou seja, do fato que ocorreu uma venda de um bem defeituoso e esse bem está muito distante da Sede da requerida que figura como sua proprietária, logicamente é mais célere e econômico a conversão da obrigação de reparar o veículo, em perdas e danos no valor necessário para que o veículo ficasse em condições de uso e ora provados.

O valor das perdas e danos sofridos pelo autor somam o importe de R$ 00.000,00 (valor por extenso), que é a soma dos orçamentos juntados aos autos.

As perdas e danos também se constituem como dano material causado ao autor no tocante aos gastos necessários para que o veículo funcionasse.

Essas razões, então, impõem que as empresas requeridas sejam condenadas, ao final, seja por essa ou outra interpretação jurídica, a pagar ao autor, a título de dano material/perdas e danos, o importe de R$ 00.000,00 (valor por extenso), como ao final se requer.

2.2. Da obrigação de fazer

No caso em tela, em função de uma venda, houve a transferência da propriedade sobre o veículo, motivo que impõe o prazo de trinta dias para que o autor providenciasse a expedição de novo CRLV – Certificado de registro e licenciamento de veículo, segundo o Artigo 123 do Código de trânsito brasileiro, abaixo copiado:

“Art. 123. Será obrigatória a expedição de novo Certificado de Registro de Veículo quando:

I – for transferida a propriedade; […]”

§ 1º No caso de transferência de propriedade, o prazo para o proprietário adotar as providências necessárias à efetivação da expedição do novo Certificado de Registro de Veículo é de trinta dias, sendo que nos demais casos as providências deverão ser imediatas.”

Desta forma, por presunção que decorre da interpretação da lei, os requeridos, em especial a empresa que figura como proprietária do veículo perante a autoridade de trânsito, não poderiam ter demorado para a entrega do documento, face ao prazo exíguo de 30 (trinta) dias que a lei determinava para que a transferência da propriedade sobre o veículo fosse alterada pelo autor.

Diante dessa obrigação, devem as requeridas, serem obrigadas à entrega, nos autos do processo, do documento necessário para a transferência do veículo para o nome do autor (DUT) em prazo razoável não superior a 10 (dez) dias, para que possa adotar as providências legais necessárias e possibilitar o uso do veículo.

A documentação de transferência (DUT), na verdade deveria ser entregue no momento da retirada do veículo da posse do vendedor, mas este negligenciou e não se importou em entregar um documento tão importante, aliás, crucial para a utilização do bem vendido.

Infelizmente esse caso não foi o primeiro e, felizmente temos, por isso, exemplos de julgamento onde a questão foi devidamente julgada, a saber:

“COMPRA E VENDA DE VEÍCULO AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE REPARAÇÃO MORAL AUSÊNCIA DE ENTREGA DA DOCUMENTAÇÃO HÁBIL À TRANSFERÊNCIA DO BEM INÉRCIA DA RÉ INDENIZAÇÃO DEVIDA E BEM DOSADA MONOCRATICAMENTE SENTENÇA MANTIDA. Apelações não providas. (TJ-SP – APL: 00118985420108260068 SP 0011898-54.2010.8.26.0068, Relator: Cristina Zucchi, Data de Julgamento: 02/02/2015, 34ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 04/02/2015)”

“COMPRA E VENDA DE VEÍCULO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE REPARAÇÃO MATERIAL E MORAL. AUSÊNCIA DE ENTREGA DA DOCUMENTAÇÃO HÁBIL À TRANSFERÊNCIA DO BEM. INÉRCIA DA RÉ. INDENIZAÇÃO MORAL DEVIDA. SENTENÇA MANTIDA. Apelação não provida. (TJ-SP – APL: 00042664620138260011 SP 0004266-46.2013.8.26.0011, Relator: Cristina Zucchi, Data de Julgamento: 08/06/2016, 34ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 13/06/2016)”

Nem se faria mais necessário tecer mais considerações a respeito, mas é de rigor que se fale na total ciência dos requeridos, que um veículo que não se pode transferir por falta da tradição do documento de transferência, até porque tal situação ocorreu quando a segunda empresa requerida comprou o veículo (logicamente recebeu o documento necessário para a transferência) e agora, negligentemente nega a entrega e causa prejuízo.

Em função do exposto, tanto no pedido de tutela de urgência que será veiculado a respeito do cumprimento urgente da obrigação da primeira requerida de entregar o DUT, quanto no pedido de confirmação e procedência da obrigação de entregar o documento para transferência, vemos que não há outra solução para a hipótese, conforme a legislação invocada, motivo que torna indissociável a procedência desse pedido, feito ao final.

2.3. Dos danos morais

Em decorrência das várias transgressões legais, o dano moral já é presumido e objetivo, em virtude das regras contidas nos artigos 186 e 927 do Código civil [2], pois configurados vários atos ilícitos, com destaque para a venda de um veículo que não se encaixava na oferta veiculada e da falta de entrega do documento que possibilite a transferência do veículo para o nome do autor.

A sustentação subjetiva do pedido de dano moral também existe neste caso, pois o autor se frustrou com o problema do veículo, perdeu seu tempo com inúmeros contatos e situações de tensão e foi ignorado. Sentindo-se mal por isso.

O autor também mantém uma revolta ininterrupta desde o dia que retirou o veículo da posse da segunda requerida, pois era sua obrigação entregar o documento para transferência do veículo, mas isso não ocorreu, mesmo com severas reclamações por parte do autor.

O Descaso para a solução do problema, o tempo perdido e a necessidade da contratação de advogado e de procurar a tutela jurisdicional são motivos suficientes para retirar a situação do campo do mero aborrecimento.

Aliás, é reprovável a conduta, tanto do vendedor, quanto de quem promoveu a venda, pois se falou uma coisa e se fez outra, o que não pode passar incólume.

E para piorar, a impossibilidade de utilização do veículo é notória frente à falta de licenciamento e de documentos que possibilitem isso, o que ocorre por culpa exclusiva da proprietária do veículo, contudo a responsabilidade pela indenização deve ser considerada solidária frente à culpa in vigilando e in elegendo da primeira requerida sobre a segunda e vice versa.

Vários julgados já deram procedência a pedidos de dano moral por causas idênticas ou semelhantes, e não se verifica alternativa que fuja à condenação das requeridas em pagar uma indenização por danos morais à autora, pela prática de atos ilícitos, em conjunto com os dissabores, a perda de tempo e a quantidade de procedimentos já tentados sem sucesso, para a obtenção de seus direitos que fundamentam o dever de indenizar.

Vejamos o exemplo abaixo, que cumpre perfeitamente a função ilustrativa do raciocínio aqui exposto:

“COMINATÓRIA C/C PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. VEÍCULO ARREMATADO EM LEILÃO. DEMORA EXCESSIVA NA ENTREGA DE DOCUMENTO NECESSÁRIO À TRANSFERÊNCIA JUNTO AO DETRAN. RESPONSABILIDADE DA LEILOEIRA. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DO VEÍCULO POR LONGO PERÍODO. PERTURBAÇÃO DA PAZ PSÍQUICA. DANO MORAL CARACTERIZADO. 1) A empresa leiloeira, contratada pelo banco proprietário do bem, integra a cadeia de fornecimento do produto vendido ao consumidor como destinatário final e, em tal condição, responde solidariamente perante este pelos danos oriundos da compra e venda. 2) Aquisição de… (TJ-RS – Recurso Cível: 71002889210 RS, Relator: João Pedro Cavalli Junior, Data de Julgamento: 24/05/2011, Terceira Turma Recursal Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 30/05/2011)” (grifo nosso)

O difícil nessa situação é dizer que não houve um aborrecimento que extrapola tudo que é considerado normal, mesmo sendo mais liberal.

Quem não ficaria sem paz no espírito, ao comprar um veículo pensando em usá-lo e encontra uma série de infortúnios, mesmo tendo pago o preço total do bem?

Sem contar que o autor é [indicar profissão] e necessita do veículo para [descrever necessidade], fato que está causando também dificuldade em sua vida profissional.

Superada a fundamentação sobre a lesão moral, se faz necessário tecer considerações acerca do valor que deve ser arbitrado.

O autor não pretende qualquer forma de enriquecimento ilícito, razão pela qual pugna pela exata aplicação da lei no sentido de que o valor da indenização não seja capaz de enriquecer o autor, tampouco de causar a bancarrota das requeridas, mas que seja suficiente para que eduque, puna e compense todas as más experiências vividas pelo autor, por culpa das requeridas, que, se cumprissem a lei fielmente, não causariam lesões que extrapolaram o campo material.

Para que, então, o instituto da indenização por dano moral atinja sua tripla finalidade, entende a autora, s.m.j., seria em torno de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para cada requerida, para que esse caso sirva de exemplo e dissuada as requeridas de práticas comerciais semelhantes e reprováveis.

Ao Poder Judiciário cabe um posicionamento rigoroso na função de resguardar as regras legais e os direitos dos cidadãos, de forma a não só reconhecer que a situação requer uma postura mais enérgica, mas que deve assim ser em homenagem à lei, ao patrimônio e ao senso de justiça.

A procedência do pedido da condenação das requeridas no pagamento de uma indenização por danos morais decorrentes de suas condutas e omissões é imperativa na situação na forma requerida.

3. Do pedido de tutela de urgência

Conforme prova documental inequívoca, o autor pagou a integralidade do valor pelo veículo já descrito e caracterizado, motivo que faz automático o dever da segunda requerida na entrega do DUT – Documento único de transferência do veículo.

Aqui, mesmo pendente o contraditório e a ampla defesa, não se mostra possível a modificação do direito do autor na obtenção do documento para que possa transferir o veículo para seu nome e para que possa utilizá-lo.

A nota-fiscal de venda é documento que demonstra de forma cabal que o dever de entregar o documento para transferência do veículo é uma obrigação inescusável da segunda requerida.

Nos termos do Artigo 300 do Código de processo civil, o presente caso reúne todas as condições para que a tutela de urgência seja concedida, especialmente a probabilidade do direito (fumus boni iuris) e o perigo de demora da prestação jurisdicional frente ao problema. Vejamos o teor da legislação:

“Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

§ 1o Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.

§ 2o A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.

§ 3o A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.”

No caso, mostra-se que é tão indiscutível que o DUT tenha que ser entregue ao autor, que nem se cogita no caso, o perigo da irreversibilidade dos efeitos da decisão, pois só se o negócio jurídico fosse desfeito, que não é o caso, é que teria importância a questão da possibilidade de irreversibilidade.

É importante que também fique claro que o autor está sendo impedido de praticar uma obrigação legal de transferir o veículo para o seu nome. Ele tinha o prazo de 30 (trinta) dias, contudo não conseguiu obedecer a lei por culpa das requeridas.

Neste diapasão, a segunda requerida deve ser obrigada, de forma liminar e sem que seja ouvida [3], a entregar ao autor, em prazo não superior a 10 (dez) dias, o DUT – Documento único de transferência, para que este possa transferir o veículo para seu nome e cumprir as exigências impostas pela lei.

Em situação idêntica, o julgado abaixo concedeu a tutela de urgência, como não poderia deixar de ser, o que vemos em sua ementa:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO COMINATÓRIA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. ENTREGA DE DUT DE VEÍCULO. I – Presentes a prova inequívoca da verossimilhança da alegação e o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, mantido o deferimento da antecipação de tutela para determinar a entrega do DUT do veículo objeto do contrato de compra e venda já quitado. II – Agravo de instrumento da ré desprovido. (TJ-DF – AGI: 20140020102695 DF 0010335-24.2014.8.07.0000, Relator: VERA ANDRIGHI, Data de Julgamento: 06/08/2014, 6ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE : 19/08/2014 . Pág.: 204)”

Então o autor pretende e requer por meio desta ação, que Vossa Excelência conceda a tutela de urgência, pois presentes os requisitos autorizadores, para que a segunda requerida seja obrigada, em prazo não superior a 10 (dez) dias, entregue o DUT-Documento único de transferência, sob pena de multa diária no importe de R$ 500,00 (quinhentos reais) por dia de descumprimento da ordem judicial, sem prejuízo da adoção de outras medidas que assegurem o resultado prático da Ordem judicial.

4. Da necessidade da inversão do ônus da prova

É de rigor que, neste caso, se inverta o encargo probatório, com fulcro no inciso VIII, do Artigo , do Código de defesa do consumidor, uma vez que mediante a forma do negócio, vemos que os requeridos estão mais bem preparados para suportar o dever de provar, em vista que possuem estrutura comercial e um deles é um grande realizador de leilões na internet, fazendo com mantenham arquivados, registros de toda a negociação e demais provas.

A situação narrada mostra um evidente má-fé, que já alerta para que o desequilíbrio processual no que atine à capacidade de produzir provas pode ser utilizado indevida e propositalmente, pois se vê a tentativa de venda de um veículo oferecido de uma forma e entregue de outra, com vários fatos acobertados pela falta de descrição exata do estado do veículo, induzindo o autor a pensar que estava comprando um veículo usado que funcionasse e tivesse condições de uso.

Assim, vemos que já existem indícios que os requeridos tentam dificultar a identificação e a natureza jurídica do negócio que mantém estabelecido, a fim de lesar direitos, o que deve ser considerado como um grave desequilíbrio processual no que se refere à capacidade de produção de provas.

Mostrar uma coisa e vender outra é um fortíssimo indício que existe sim a intenção de utilizar-se de artifícios que impõem que seja provado que o autor não fala a verdade.

Além do mais, detém as requeridas, grande capacidade financeira, visto que o objeto de suas atividades comerciais presume isso, sendo notória a vantagem financeira sobre a autora, o que também expõe o desequilíbrio processual que merece ser corrigido.

Por isso requer-se ao final, que Vossa Excelência inverta o ônus da prova, com fulcro no artigo , inciso VIII, do CDC.

5. Das considerações finais

Após a exposição das razões, fundamentos e elementos que possibilitaram uma visão ampla do problema e das infrações legais que as requeridas causaram com suas ações/omissões, fica evidente que agiram em desacordo com a legislação consumerista e causaram danos, que devem ser reparados, sem contar a obrigação de fazer, que deve ser igualmente cumprida, de forma forçada.

Vender um veículo anunciado como presumidamente em condições de usar, não poderia ser entregue da forma que foi, com parte do motor desmontado, tampouco poderia ocorrer a falta da entrega do documento para a transferência da propriedade.

A procedência da ação em todos os seus pedidos é esperada em vista das provas que já se produz desde o início desta ação e em função das que serão produzidas no curso da instrução processual.

As requeridas agiram errado, agiram mal, tentam enganar em um ambiente (comercial) onde deve imperar a boa-fé objetiva, a lealdade e a verdade, premissas ignoradas e negadas pelas requeridas que mostraram visar o lucro mediante atitudes totalmente inaceitáveis e que devem ser a causa da total procedência da ação, conforme os pedidos abaixo alinhavados.

6. Dos pedidos

Face ao exposto requer-se:

a) Que a presente ação seja processada, distribuída e recebida, na forma da lei;

b) Que seja concedida a tutela de urgência pleiteada, consistente na determinação para que a segunda requerida faça a entrega do DUT – documento único de transferência, ao autor, do veículo da Marca xxxxxxx, Modelo xxxxxxxxxxx, Ano de fabricação 2.010, cor preta, placas XXX – 0000, no prazo máximo de 10 (dez) dias, para que seja possível a transferência e regularização do referido veículo, sob pena de multa diária em valor a ser sabiamente fixado por este Douto Juízo ou mesmo na aplicação da pena de crime de desobediência, para que o resultado prático desta decisão seja plenamente assegurado;

c) Que as rés sejam citadas, por via postal, nos endereços fornecidos no preâmbulo desta petição inicial, para que ofereçam reposta, no prazo legal, sob pena da aplicação dos efeitos da revelia;

d) Que seja, ab initio invertido o encargo probatório, com fundamento legal no artigo , inciso VIII, do Código de defesa do consumidor;

e) Que as rés sejam consideradas como solidariamente responsáveis pelas obrigações cobradas nesta ação, com exceção da obrigação de entrega do DUT – Documento único de transferência do veículo já descrito e caracterizado que cabe exclusivamente à segunda requerida,

f) Que a ação seja julgada totalmente procedente para:

(i) confirmar a tutela de urgência para determinar à segunda requerida, a entrega do Documento único de transferência do veículo já descrito para o autor, sob pena de multa diária em valor a ser fixado por Vossa Excelência;

(ii) que as rés, de forma solidária, sejam condenadas a pagar ao autor, o valor de R$ 00.000,00 (Valor por extenso), a título de indenização pelos reparos necessários no veículo, configurados como perdas e danos e ou danos materiais;

(iii) que as rés, de forma solidária, sejam condenadas a pagar ao autor, uma indenização por dano moral, em importe a ser sabiamente fixado por Vossa Excelência, para que atinja sua tríplice finalidade, mas não inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais);

g) Que as requeridas sejam condenadas ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, na forma da lei;

h) que Vossa Excelência designe audiência de tentativa de conciliação, por ser do interesse do autor;

i) o direito de provar o alegado por todas as modalidades de provas em direito admitidas, notadamente pelo depoimento pessoal dos representantes legais das requeridos, oitiva de testemunhas, juntada de documentos novos, perícias, vistorias e quaisquer outras que sejam ou venham a ser necessárias para o exercício da ampla defesa de direitos;

Dá-se à causa o valor de R$ 00.000,00 (Valor por extenso), para os fins de direito.

Nestes termos,

P. deferimento.

Cidade, dia, mês e ano.

Nome do Advogado

Número da OAB

Advogado

Notas:

[1] Código de defesa do consumidor – Art.  Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

Código civil – Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Código civil – Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

[3] Código de processo civil – Art. 9o Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida. Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica: I – à tutela provisória de urgência; II – às hipóteses de tutela da evidência previstas no art. 311, incisos II e III;